O Supremo Tribunal Federal (“STF”) julgou improcedentes as Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 7.596 e 7.617 (“ADIs”), nas quais o Partido Renovação Democrática (“PRD”) e o Partido Democrático Trabalhista (“PDT”), respectivamente, contestavam dispositivos da Lei Federal nº 13.576/2017, que instituiu a Política Nacional de Biocombustíveis (“RenovaBio”). O voto do Ministro Relator Nunes Marques confirmou a constitucionalidade das metas compulsórias de descarbonização e do modelo de Créditos de Descarbonização (“CBIOs”), além da obrigação de aquisição desses créditos pelos distribuidores de combustíveis fósseis, reforçando que “o debate sobre o RenovaBio precisa gravitar em torno das graves questões climáticas que têm deixado o mundo em alerta”.
O RenovaBio é um programa do governo federal que tem por objetivo promover a descarbonização do setor de transportes, incentivando a produção e o uso de biocombustíveis e contribuindo para a redução das emissões de gases de efeito estufa no Brasil. O programa estabelece: metas de descarbonização, aplicáveis a distribuidores de combustíveis fósseis; emissão de CBIOs por produtores de biocombustíveis/biomassa; e aquisição dos CBIOs pelas distribuidoras, para fins de comprovação das metas de descarbonização.
Por meio das ADIs, alegou-se (1) violação de princípios constitucionais como isonomia, livre iniciativa, livre concorrência e poluidor-pagador, (2) que o RenovaBio imporia ônus excessivo aos distribuidores, considerados como “meros operadores logísticos”, e que o desenho da política criaria riscos concorrenciais e possibilidade de especulação na emissão de CBIOs, (3) que o processo legislativo teria sofrido desvio de finalidade, orientado por interesses econômicos particulares, (4) a ineficiência, para a defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado, da intervenção estatal no domínio econômico de natureza meramente remuneratória em benefício seletivo de industriais e importadores de biocombustíveis.
O Ministro Relator compreendeu que o RenovaBio foi concebido com base em avaliações técnicas amplas, envolvendo governo, setor produtivo e sociedade civil, e que a opção de atribuir aos distribuidores a responsabilidade pela aquisição dos CBIOs decorre de critérios objetivos relacionados à posição que ocupam na cadeia de combustíveis. Assim, entendeu que não há violação (1) ao princípio do poluidor-pagador, uma vez que os CBIOs não equivalem às multas ou indenizações aplicadas aos poluidores do ar, sendo “adequado que os usuários finais, responsáveis por quase 60% das emissões, arquem mesmo com os ônus da política de transição energética”, e (2) à ordem econômica e à livre concorrência pois o sistema conta com duas âncoras aptas a prevenir a fixação de quantidades desarrazoadas de CBIOs a serem adquiridos: (a) a vinculação das metas à participação do distribuidor no volume total de combustíveis fósseis comercializados no ano anterior, e (b) metas devem corresponder à disponibilidade de biocombustíveis ofertados por produtores ou importadores que possuem o Certificado da Produção Eficiente de Biocombustíveis.
Registrou, ainda que, diante da intenção de garantir aos biocombustíveis competitividade no mercado, os produtores e importadores não podem abrir mão de receitas, aí incluída a parte proveniente da emissão e da venda dos CBIOs. Ainda segundo o relator, a atuação dos distribuidores não implica que o custo da política recaia exclusivamente sobre eles, já que o ônus econômico da descarbonização recai sobre os “usuários de veículos movidos por combustíveis fósseis, notadamente gasolina ou óleo diesel”, e não sobre os agentes intermediários.
Por fim, o STF reconheceu que não houve demonstração de abuso no processo de aprovação da norma e que ao Poder Judiciário não é dado se imiscuir em aspectos relativos ao mérito das políticas públicas adotadas pelos Poderes Legislativo e Executivo.
Figuraram como interessados o Presidente da República, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, o Ministério de Minas e Energia, o Congresso Nacional, além de diversas entidades como amici curiae.
Fontes:
https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2025/11/voto-Kassio-RenovaBio.pdf